6.05.2011

Análise da primeira Carta aos Coríntios

1. Redacção da Carta

1.1. A comunidade de Corinto

Corinto era uma cidade culturalmente forte, marcada pela beleza. No tempo de Paulo a cidade de Corinto era muito próspera, devido à sua localização estratégica. Ela localiza-se num estreito com cerca de 6,3 km entre o mar Egeu e o Adriático. Assim, ele possuía dois portos correspondentes aos dois extremos do estreito, e era uma cidade através da qual passavam as mercadorias, em vez de seguirem de barco, percorrendo um caminho mais longo e contornando a península.

A cidade foi reconstruíuda em 44 a. C. e nela existia no cimo da colina da cidade, um grande templo de Afrodite, cujo culto de fazia de modo privilegiado pela prostituição sagrada. Além disso, como era marcada por uma efemeridade na estadia, com muita circulação de pessoas, era conhecida pela liberdade de costumes.

Era uma grande metrópole, tinha um grande porto. Tinha um grande tempo a Afrodite, cuja forma era a prostituição sagrada. Lá havia uma grande glorificação do prazer.

Havia também os chamados Jogos Ístmicos, que não eram só atléticos mas também culturais, que se celebravam em Corinto de dois em dois anos.

Calcula-se que, à chegada de Paulo, a cidade teria cerca de 50 mil habitantes. E quanto à Igreja que aí se instalou teria algumas dezenas.

Act 18, 1-4

1Depois disso, Paulo afastou-se de Atenas e foi para Corinto. 2Encontrou ali um judeu chamado Áquila, natural do Ponto, recentemente chegado da Itália com Priscila, sua mulher, porque um édito de Cláudio ordenara que todos os judeus se afastassem de Roma. Paulo foi procurá-los 3e, como eram da mesma profissão - isto é, fabricantes de tendas - ficou em casa deles e começou a trabalhar. 4Todos os sábados dissertava na sinagoga e esforçava-se por convencer, tanto a judeus como a gregos.

1 Cor, 2, 33

Estive no meio de vós cheio de fraqueza, de receio e de grande temor.

Paulo chega a Corinto e sente-se esmagado. Como é seu hábito vai primeiro à sinagoga, anuncia. A ideia de que a pregação de Paulo foi aos pagãos não está bem definida, pois a linguagem e analogias são da mundividência judaica. Começar pela sinagoga é começar pelos judeus não é só começar pelos judeus, pois cada sinagoga tinha uma cerca de simpatizantes, que não eram judeus.

Havia elites próximas do judaísmo, pois gregos são pessoas que pensam e exploram, que procuram um sentido racional para as coisas. Pode haver muitos deuses, mas tem que haver um princípio. Às apalpadelas sentiam que o divino estava próximo do humano, e para algumas elites fazia sentido dizer que só havia um Deus. Como o Judaísmo dizia isso, muitos aproximavam-se. Além disso, atraía-os a dimensão ética, com a sua exigência, que afastava muitos, mas também despertava a curiosidade e simpatia de outros..

Quando rompe com a sinagoga, Paulo continua a ter aquele grupo. A maior parte dos pagãos do tempo, se forem só pagãos, não conseguem perceber uma única carta de Paulo, pois tem um excessivo background bíblico. Havia uma semente que Paulo ia trabalhando.

Paulo demorou-se em Corinto um ano e seis meses a pregar a Palavra de Deus. O Cristianismo passa de boca em boca, expande-se em redes. Havia, de facto, o ofício de artesãos de tendas, e aí Paulo fabricava e falava. É um Cristianismo que nasce do contacto humano.

Daqui vai para Éfeso, que fica no outro lado do mar Egeu. Vai visitar cidades que têm um importante nó de comunicação.

Estando Paulo em Éfeso, próximo de Corinto, levava a que houvesse circulação de informação. Aí começa a relação epistolar com Corinto. De facto, Paulo estava em Éfeso, mas continuava a saber o que se passava em Corinto.

1 Cor 11

11Pois, meus irmãos, fui informado pelos da casa de Cloé, que há discórdias entre vós. 12Refiro-me ao facto de cada um dizer: «Eu sou de Paulo», ou «Eu sou de Apolo», ou «Eu sou de Cefas», ou «Eu sou de Cristo». 13Estará Cristo dividido? Porventura Paulo foi crucificado por vós? Ou fostes baptizados em nome de Paulo? 14Dou graças a Deus por não ter baptizado nenhum de vós, a não ser Crispo e Gaio, 15para que ninguém diga que fostes baptizados em meu nome. 16Baptizei também a família de Estéfanes, mas, além destes, não sei se baptizei mais alguém.

1 Cor 7, 1

1Mas a respeito do que me escrevestes, penso que seria bom para o homem abster-se da mulher.

Assim, sabemos que devem certamente ter existido 4 cartas, das quais temos apenas 2. Alguns autores defendem que a primeira carta que temos é, na verdade, a segunda. Outros dizem que as 4 cartas estão condensadas em duas.

A primeira Carta aos Coríntios datará de cerca dos anos 54-57, por ocasião da terceira viagem missionária de Paulo.

1.1.1. Os “pneumáticos”

Havia uma disposição dos Coríntios de viverem num certo esoterismo, numa procura espiritual que se conduzia a si mesma, desprezando as realidades corporais. De facto, era uma comunidade tipicamente helénica, marcada pelo dualismo corpo-alma, no qual o corpo era desprezado.

As matérias que diziam respeito à vida material e social não os alteravam, não os motivavam. Pelo contrário, a vida interior, a vida dos dons, a vida carismática e espiritual levava-os até a uma exasperação. Em alguns momentos de 1Cor encontramos uma tendência para um ascetismo exasperado.

Por outro lado, percebemos que também eles acreditavam numa escatologia já realizada, já tudo tinha acontecido. Espiritualizavam a ressurreição futura como se espiritualmente no presente já se tivesse cumprido. Não era uma escatologia iminente, mas acontecida, já contida no interior da própria insistência. Levava exacerbar a auto-estima que os coríntios tinham pelo seu conhecimento espiritual. Não estavam à espera de nada, de uma consolação ou plenitude. A escatologia não era horizonte, mas dado integrado na sua experiência. Por isso absolutizavam a experiência espiritual que faziam. Isto levava a divisões dentro da comunidade: “Eu sou de Paulo, eu sou de Cefas, de sou de Paulo, eu sou de Cristo”.

2. Estrutura

Introdução (1, 1-9)

A introdução dá-nos logo um tom inicial eclesiológico, muito relevante. Para a compreensão da carta, pois é a situação concreta da comunidade que faz a unidade da carta.

1. (1, 10 – 3, 23)

a. Os partidos e as divisões na comunidade, pela informação dos da “casa de Cloé”. Paulo tenta superar as facções por uma dependência incondicional de Cristo.

b. A sabedoria cristã.

2. (4, 1 – 6, 11)

a. Paulo apresentando provocadoramente como modelo. Os coríntios estão marcados pelo contágio do mundo: o caso de incesto e relação dos cristãos com a justiça pagã.

3. (6, 12 – 11, 1)

a. Paulo aplica a lei do Espírito à corporeidade. A partir de 1 Cor 7 passa a responder concretamente às questões colocadas pelos coríntios: matrimónio, virgindade, viuvez e corpo. O corpo ou era a perfeição da arte ou era a prisão da alma, logo sem importância. Paulo vai defender que somos chamados a glorificar a Deus no nosso corpo, e o corpo é um templo.

b. Fala também sobre as carnes sacrificadas aos ídolos.

4. (11, 2 – 16, 4)

a. O traço de união que une esta última secção é o das assembleias litúrgicas, com aspectos práticos referentes às reuniões da comunidade.

b. Encontramos aqui a questão do véu das mulheres, a celebração da Ceia do Senhor, a questão dos carismas na comunidade. O critério da comunidade deve ser a realidade da ressurreição. Fala-se também da colecta, um dos grandes temas de fundo paulinos, que é vista com uma expressão espiritual, comparada ao sacrifício eucarístico.

Conclusão (16, 5-24)

Recomendações práticas e saudações

3. Temas

3.1. Uma teologia aplicada

Como ponto prévio, é importante referir que a teologia de Paulo é contextual, aplicada às circunstâncias concretas da comunidade, pois é na sua história e na dramaticidade do seu quotidiano que se encontra uma reflexão mais apurada.

A teologia de Paulo nasce, pois, de uma situação vivida por ele ou pela própria comunidade.

Há, por isso, uma grande ligação entre teologia e vida pastoral, ou seja, uma “teologia aplicada”.

Assim, analisar os vários temas da 1 Cor, a partir da sua divisão estrutural.

3.2. A Cruz e a sabedoria cristã

Aquilo que para Paulo se torna o distintivo diferencial da existência cristã é a linguagem da cruz. Em Paulo a Cruz é um “Lógos”, uma racionalidade, com uma gramática própria. Do ponto de vista histórico, a cruz durou pouco tempo, mas Paulo reporta-se constantemente à cruz:

1 Cor 1, 23

nós pregamos um Messias crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios.

Quando Paulo escreve isto, Cristo não está Crucificado, mas Paulo mostra como a permanência de Cristo na cruz ultrapassa a mera crónica dos acontecimentos.

Mas aqui, Cristo Crucificado é também o Cristo Ressuscitado, que dá ao homem uma nova vitalidade, que o faz viver de outro modo, com outro alento, pois recebe o próprio Espírito de Cristo Ressuscitado. A cristologia aqui presente é, pois, essencialmente pascal, e nela estão os dinamismos da vida cristã: o cristão é alguém que é transformado e santificado em Cristo.

1 Cor 1, 30

É por Ele que vós estais em Cristo Jesus, que se tornou para nós sabedoria que vem de Deus, justiça, santificação e redenção.

Falar assim da sabedoria que vem de Deus em Cristo, corresponde a uma mudança fundamental: Paulo afirma a diferença da fé cristã, que rompe com o passado, transportando-nos para o interior de Cristo.

Em Corinto, a procura da sabedoria e da racionalidade estruturam o sentido e a significação da existência. De facto, um conceito fundamental para os gregos, como se vê nas tragédias, é a justiça (transgressão – culpa – sanção). Paulo vai apontar então o Cristianismo como alternativa ao mundo grego, entrando assim no campo rival. Na Grécia tudo era religião, toda a gente vivia numa procura de santificação.

Ora, Cristo é Aquele que nos santifica: dizer o que Paulo disse é muito forte para os gregos.

Redenção quer dizer devolução ao nosso dono original, voltar para uma nova pertença, por isso, Cristo é uma pertença. Com esta palavra, Paulo faz uma declaração de guerra, possibilita uma implosão social, pois é contra-cultura, colocando o Cristianismo como alternativa àquele mundo. Esta carta é, assim, um verdadeiro grito pela liberdade. Não podemos esquecer que predominava uma sociedade com as suas tipologias, conceitos e valores. Subsistia uma sociedade de status dado pelo sangue, raça, nação ou pelo clã, e o espaço da consciência individual era nulo. Mas Paulo apresenta alternativas: quando fala da glorificação de Deus no nosso corpo pela virgindade, abre uma brecha. A referencialidade, o eixo para a sociedade e para o homem é Cristo e isso não se fez sem luta.

A sabedoria depende de tal modo de Cristo e do Seu Espírito que para Paulo Cristo não foi, Cristo é. Para Paulo o Espírito é o que dá a vida.

1 Cor 2, 16

Pois quem conheceu o pensamento do Senhor, para poder instruí-lo? Mas nós temos o pensamento de Cristo.

É como se Cristo fosse em nós o intérprete do mundo e da nossa existência. Paulo está assim a definir um novo eixo, a apresentar a alternativa cristã, sabendo que este discurso é para cristãos já maduros, que podem compreender a sabedoria cristológica.

1 Cor 1, 20-25

Onde está o sábio? Onde está o letrado? Onde está o investigador deste mundo? Acaso não tornou Deus louca a sabedoria deste mundo? 21Pois, já que o mundo, por meio da sua sabedoria, não reconheceu a Deus na sabedoria divina, aprouve a Deus salvar os que crêem, pela loucura da pregação. 22Enquanto os judeus pedem sinais e os gregos andam em busca da sabedoria, 23nós pregamos um Messias crucificado, escândalo para os judeus e loucura para os gentios. 24Mas, para os que são chamados, tanto judeus como gregos, Cristo é poder e sabedoria de Deus. 25Portanto, o que é tido como loucura de Deus, é mais sábio que os homens, e o que é tido como fraqueza de Deus, é mais forte que os homens.

O Cristianismo contraria o mundo nos seus eixos, e não apenas moralmente. Isso quer dizer o viver de outra forma, com outro sentido. Vemos assim que Paulo desloca o Cristianismo das procuras que tanto os judeus como os gregos fazem. Ser cristão é outra coisa, é uma pretensão original: Cristo é poder e sabedoria de Deus. Este é o âmago da novidade cristã.

3.3. Teologia da corporeidade

Paulo transcende e vê as representações do corpo em diálogo com a tradição judaica e helenista-romana. Paulo diz que temos muitos corpos, isto é, muitas representações e vivências do corpo, fazendo uma reivindicação original do corpo em relação ao sujeito. O corpo era uma realidade negativa, uma espécie de sarcófago onde a alma estava aprisionada.

Ora Paulo tem uma visão unitária do homem, que integra a totalidade e inteireza da pessoa, onde o corpo não é apenas invólucro da alma: cada um de nós é o seu corpo. A dimensão tangível do corpo está ligada a uma dimensão intangível da pessoa, o que é uma pretensão inédita.

1 Cor 6, 20

20Fostes comprados por um alto preço! Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo.

Na sociedade antiga o corpo não tinha uma dignidade em si. Existia o corpus social, mas não o corpo. Quando em 1 Cor 7 Paulo faz uma apologia da virgindade, ergue uma grande bandeira de liberdade humana. Ele diz que as pessoas não estão tuteladas por um imperativo que determina a dicção do próprio corpo e da sexualidade humana. O que nós encontramos em Paulo é então uma ruptura: o corpo ganha espaço face ao corpus, revestindo o indivíduo de uma liberdade em relação ao corpo social. Esta é uma herança cristã, com elementos que não eram os elementos consensuais no seu tempo.

Ele vai falar do corpo como relação, já que o homem não se basta a si mesmo: estamos sempre em relação com um outro corpo, e essa relação dá sentido à própria vida. A vida do corpo é reciprocidade, é relação, e não só com o corpus social, mas numa relação com Deus. Então agora o centro estruturante do que somos não é a raça, língua, género, etc., mas a pertença a uma pessoa: Jesus Cristo. Paulo relativiza todas as fronteiras e divisões.

Esta mudança de paradigma faz ruir as estruturas do mundo do tempo: um escravo ou homem livre são a mesma coisa na adesão a Jesus Cristo. Ora o corpo individual estava sequestrado por um corpo social, onde só havia um modelo dominante. Estes capítulos 6 e 7 são, pois, de ruptura. A sua teologia é perigosa porque a sua centralidade cristológica abriu espaço para a novidade, dizendo às culturas que o Cristianismo é outra coisa, ou seja, ser de Cristo é, em primeiro lugar, a forma como se vive o próprio corpo.

1 Cor 6, 12ss

12«Tudo me é permitido», mas nem tudo é conveniente. «Tudo me é permitido», mas eu não me farei escravo de nada. 13Os alimentos são para o ventre, e o ventre para os alimentos, e Deus destruirá tanto aquele como estes. Mas o corpo não é para a impureza, mas para o Senhor, e o Senhor é para o corpo. 14E Deus, que ressuscitou o Senhor, há-de ressuscitar-nos também a nós, pelo seu poder. 15Não sabeis que os vossos corpos são membros de Cristo? Iria eu, então, tomar os membros de Cristo para fazer deles membros de uma prostituta? Por certo que não! 16Ou não sabeis que aquele que se junta a uma prostituta, torna-se com ela um só corpo? Pois, como diz a Escritura: Serão os dois uma só carne. 17Mas quem se une ao Senhor, forma com Ele um só espírito. 18Fugi da impureza. Qualquer outro pecado que o homem cometa é exterior ao seu corpo, mas quem se entrega à impureza, peca contra o próprio corpo. 19Não sabeis que o vosso corpo é o templo do Espírito Santo, que habita em vós, porque o recebestes de Deus, e que vós já não vos pertenceis? 20Fostes comprados por um alto preço! Glorificai, pois, a Deus no vosso corpo.

Paulo está a dizer que fomos comprados, logo somos exorbitados. Esta glorificação de Deus no corpo é um aforismo Paulino fundamental: o nosso corpo é Templo do Espírito Santo.

Paulo defende aqui uma moral humana, que serve para todos e não só especificamente para os cristãos. Cristo torna-se o referente do mundo e de organização da própria vida.

Estes textos são um verdadeiro manifesto. O que interessa a Paulo é a compreensão de Cristo como eixo e o que isso representa como novidade absoluta na história.

3.4. Matrimónio e celibato

Paulo não pretende dissecar o matrimónio, mas mostrar como o cristão deve viver todas as dimensões da nossa vida a partir do Senhor.

1 Cor 7, 1-11

1Mas a respeito do que me escrevestes, penso que seria bom para o homem abster-se da mulher. 2Todavia, para evitar o perigo da incontinência, cada homem tenha a sua mulher e cada mulher, o seu marido. 3O marido cumpra o dever conjugal para com a sua esposa, e a esposa faça o mesmo para com o seu marido. 4A esposa não pode dispor do próprio corpo, mas sim o marido; e, do mesmo modo, o marido não pode dispor do próprio corpo, mas sim a esposa. 5Não vos recuseis um ao outro, a não ser de mútuo acordo e por algum tempo, para vos dedicardes à oração; depois, voltai de novo um para o outro, para que Satanás não vos tente devido à vossa incapacidade de autodomínio. 6Digo isto como concessão e não como ordem. 7Desejaria que todos os homens fossem como eu, mas cada um recebe de Deus o seu próprio carisma, um de uma maneira, outro de outra. 8Aos solteiros e às viúvas digo que é bom para eles ficarem como eu. 9Mas, se não podem guardar continência, casem-se; pois é melhor casar-se do que ficar abrasado. 10Aos que já estão casados, ordeno, não eu, mas o Senhor, que a mulher não se separe do marido; 11se, porém, está separada, não se case de novo, ou, então, reconcilie-se com o marido; e o marido não repudie a sua mulher.

Paulo está a marcar verdadeiramente uma ruptura, que fundamenta a identidade cristã. É uma moral para o indivíduo, e não para o Povo, como com Moisés. Descreve então o matrimónio como o lugar da intimidade e da relação com Cristo, e não da autonomia. O casamento é um lugar onde a santidade se constrói: marido pode salvar a sua esposa e vice-versa.

1 Cor 7, 18-24

18Alguém era já circuncidado, quando foi chamado? Não disfarce a sua circuncisão. Era incircunciso, quando foi chamado? Não se faça circuncidar. 19A circuncisão não é nada, e nada é a incircuncisão; o que conta é a observância dos mandamentos de Deus. 20Permaneça cada um na condição em que se encontrava, quando foi chamado. 21Eras escravo, quando foste chamado? Não te preocupes com isso. Mas, ainda que pudesses tornar-te livre, procura, antes, tirar proveito da tua condição. 22Pois o escravo, que foi chamado no Senhor, é um liberto do Senhor. Do mesmo modo, o que era livre quando foi chamado, é um escravo de Cristo. 23Fostes comprados por um alto preço; não vos torneis escravos dos homens. 24Irmãos, permaneça cada um, diante de Deus, na condição em que se encontrava quando foi chamado.

São palavras de insurreição e de subversão. O importante é não se tornarem escravos das coisas e afirmar a senhoria de Cristo. No fundo Paulo está a dizer que há só uma lei: não dependemos de nenhum ordenamento.

1 Cor 7, 24-40

25 A respeito de quem é solteiro, não tenho nenhum preceito do Senhor, mas dou um conselho, como homem que, pela misericórdia do Senhor, é digno de confiança. 26Julgo, pois, que essa condição é boa, por causa das angústias presentes; sim, é bom para o homem continuar assim. 27Estás comprometido com uma mulher? Não procures romper o vínculo. Não estás comprometido? Não procures mulher. 28Todavia, se te casares, não pecas; e se uma virgem se casar, também não peca. Mas estes terão de suportar as tribulações corporais e eu quisera poupar-vos a elas. 29Eis o que vos digo, irmãos: o tempo é breve. De agora em diante, os que têm mulher, vivam como se não a tivessem; 30e os que choram, como se não chorassem; os que se alegram, como se não se alegrassem; os que compram, como se não possuíssem; 31os que usam deste mundo, como se não o usufruíssem plenamente. Porque este mundo de aparências está a terminar. 32Eu quisera que estivésseis livres de preocupações. Quem não tem esposa, cuida das coisas do Senhor, como há-de agradar ao Senhor. 33Mas aquele que tem esposa cuida das coisas do mundo, como há-de agradar à mulher, 34e fica dividido. Também a mulher não casada, tal como a virgem, cuidam das coisas do Senhor, para serem santas de corpo e de espírito. Mas a mulher casada cuida das coisas do mundo, como há-de agradar ao marido. 35Digo-vos isto para vosso bem, não para vos armar uma cilada, mas visando o que é mais nobre e favoreça uma dedicação ao Senhor, sem partilha. 36Se alguém, cheio de vitalidade, receia faltar ao respeito à sua noiva e pensa que as coisas devem seguir o seu curso, faça o que lhe parecer melhor. Não peca; que se casem. 37Mas, se alguém tomou a firme resolução no seu coração, sem constrangimento e no pleno uso da sua vontade, e resolve no seu foro íntimo respeitar a sua noiva, fará bem. 38Portanto, aquele que desposa a sua noiva faz bem; e quem a não desposa ainda faz melhor. 39A mulher permanece ligada ao seu marido enquanto ele viver. Se, porém, o marido vier a falecer, fica livre para se casar com quem quiser, contanto que seja no Senhor. 40Todavia, na minha opinião, será mais feliz, se permanecer como está. Julgo que também eu tenho o Espírito de Deus.

Paulo apresenta uma nova categoria de vida: o estado de virgindade, é um estado de disponibilidade. A virgindade representa pois a novidade, a possibilidade de relativizar todas as coisas e de abrir naquele espaço a uma nova virtualidade, linguagem e modalidade do corpo.

Introduz também um novo conceito de temporalidade: o tempo foi alterado depois do sismo que é Jesus Cristo, não na sua quantidade mas na sua qualidade. O kairós tornou-se breve, condensou-se. Há, assim, uma reciprocidade escatológica entre Cristo e o cristão.

3.5. A comunidade cristã

Paulo tem uma ambição: para ele o Cristianismo determina um novo paradigma face ao anterior, onde o que fundava o espírito da cidade era o sangue, a nação e o status.

A partir do capítulo 11 da carta aos Coríntios, Paulo vai defrontar a questão de saber se o Cristianismo é capaz de construir um paradigma alternativo ao modelo social vigente. Partindo das assembleias litúrgicas, mais que saber quem é digno de celebrar a Eucaristia, Paulo afirma que os coríntios apenas mantém convivialidade no rito, mas não constroem um paradigma social, ou seja, não celebram dignamente a Eucaristia, não cumprindo bem a memória de Jesus.

1 Cor 11, 17ss

17Feitas estas advertências, não posso louvar-vos: reunis-vos, não para vosso proveito, mas para vosso dano. 18Em primeiro lugar, ouço dizer que, quando vos reunis em assembleia, há divisões entre vós, e em parte eu acredito. 19É mesmo necessário que haja divisões entre vós, para que se tornem conhecidos aqueles que de entre vós resistem a esta provação. 20Quando, pois, vos reunis, não é a ceia do Senhor que comeis, 21pois cada um se apressa a tomar a sua própria ceia; e enquanto um passa fome, outro fica embriagado. 22Porventura não tendes casas para comer e beber? Ou desprezais a Igreja de Deus e quereis envergonhar aqueles que nada têm? Que vos direi? Hei-de louvar-vos? Nisto, não vos louvo. 23Com efeito, eu recebi do Senhor o que também vos transmiti: o Senhor Jesus na noite em que era entregue, tomou pão 24e, tendo dado graças, partiu-o e disse: «Isto é o meu corpo, que é para vós; fazei isto em memória de mim». 25Do mesmo modo, depois da ceia, tomou o cálice e disse: «Este cálice é a nova Aliança no meu sangue; fazei isto sempre que o beberdes, em memória de mim.» 26Porque, todas as vezes que comerdes deste pão e beberdes deste cálice, anunciais a morte do Senhor, até que Ele venha. 27Assim, todo aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será réu do corpo e do sangue do Senhor. 28Portanto, examine-se cada um a si próprio e só então coma deste pão e beba deste vinho; 29pois aquele que come e bebe, sem distinguir o corpo do Senhor, come e bebe a própria condenação. 30Por isso, há entre vós muitos débeis e enfermos e muitos morrem. 31Se nos examinássemos a nós mesmos, não seríamos julgados; 32mas, quando somos julgados pelo Senhor, Ele corrige-nos, para não sermos condenados com o mundo. 33Por isso, meus irmãos, quando vos reunirdes para comer, esperai uns pelos outros. 34Se algum tem fome, coma em casa, a fim de não vos reunirdes para vossa condenação. Quanto a outros assuntos, hei-de resolvê-los quando chegar.

Paulo dirige-se aos coríntios a partir das implicações da Eucaristia, falando do Corpo de Cristo, que se oferece.

1 Cor 11, 12-31

12Pois, como o corpo é um só e tem muitos membros, e todos os membros do corpo, apesar de serem muitos, constituem um só corpo, assim também Cristo. 13De facto, num só Espírito, fomos todos baptizados para formar um só corpo, judeus e gregos, escravos ou livres, e todos bebemos de um só Espírito. 14O corpo não é composto de um só membro, mas de muitos. 15Se o pé dissesse: «Uma vez que não sou mão, não faço parte do corpo», nem por isso deixaria de pertencer ao corpo. 16E se o ouvido dissesse: «Uma vez que não sou olho, não faço parte do corpo», nem por isso deixaria de pertencer ao corpo. 17Se todo o corpo fosse olho, onde estaria o ouvido? Se todo ele fosse ouvido, onde estaria o olfacto? 18Deus, porém, dispôs os membros no corpo, cada um conforme lhe pareceu melhor. 19Se todos fossem um só membro, onde estaria o corpo? 20Há, pois, muitos membros, mas um só corpo. 21Não pode o olho dizer à mão: «Não tenho necessidade de ti», nem tão pouco a cabeça dizer aos pés: «Não tenho necessidade de vós.» 22Pelo contrário, quanto mais fracos parecem ser os membros do corpo, tanto mais são necessários, 23e aqueles que parecem ser os menos honrosos do corpo, a esses rodeamos de maior honra, e aqueles que são menos decentes, nós os tratamos com mais decoro; 24os que são decentes, não têm necessidade disso.

Mas Deus dispôs o corpo, de modo a dar maior honra ao que dela carecia, 25para não haver divisão no corpo e os membros terem a mesma solicitude uns para com os outros. 26Assim, se um membro sofre, com ele sofrem todos os membros; se um membro é honrado, todos os membros participam da sua alegria. 27Vós sois o corpo de Cristo e cada um, pela sua parte, é um membro. 28E aqueles que Deus estabeleceu na Igreja são, em primeiro lugar, apóstolos; em segundo, profetas; em terceiro, mestres; em seguida, há o dom dos milagres, depois o das curas, o das obras de assistência, o de governo e o das diversas línguas. 29Porventura são todos apóstolos? São todos profetas? São todos mestres? Fazem todos milagres? 30Possuem todos o dom das curas? Todos falam línguas? Todos as interpretam? 31Aspirai, porém, aos melhores dons. Aliás, vou mostrar-vos um caminho que ultrapassa todos os outros.

O Cristianismo vai assumir-se então como uma ruptura, que constrói uma sociedade heterogénea (não se limita a uma etnia, cultura…), por contraposição ao modelo da Antiguidade, onde tudo era homogéneo: amigos da mesma classe, meio, educação, etc.

O Cristianismo, para se poder construir, precisou de sair do templo para a casa. Agora precisa de sair da casa helenista, da casa humana, formando uma comunidade mista e heterogénea: um Corpus: individual e colectivo.

Isto não significa que a Igreja seja uma assembleia fragmentária, um lugar heterogéneo. Ela é um Corpo, um corpo espiritual, eucaristizado: é o Corpo de Cristo. Paulo usa a imagem de um corpo carismático, de um corpo místico, porque somos o corpo de Cristo, e não apenas o nosso corpo. É um corpo trabalhado espiritualmente, no sentido de que este não é um corpo repetido e homogéneo, mas que se constrói na pluralidade de dons.

Já no capítulo 14 Paulo usa a imagem da orquestra, definindo os membros da Igreja como instrumentos que têm que se ouvir harmoniosamente ao mesmo tempo.

1 Cor 14, 6ss

6Imaginai agora, irmãos, que eu ia ter convosco e vos falava em línguas: de que utilidade vos seria, se nada vos comunicasse nem por revelação, nem por ciência, nem por profecia, nem por ensinamento? 7O mesmo acontece com os instrumentos de música, como a flauta ou a cítara: se não emitirem sons distintos, como identificar a melodia tocada? 8E, se a trombeta só emitir sons confusos, quem é que se prepara para a guerra? 9Do mesmo modo vós: se a vossa língua não proferir um discurso inteligível, como se há-de saber o que dizeis? Sereis como quem fala ao vento. 10Há no mundo não sei quantas espécies de línguas, e todas têm o seu significado. 11Ora, se eu não conheço o significado de uma língua, serei como um bárbaro para aquele que fala e aquele que fala, também o será para mim. 12Assim também vós: já que estais ávidos dos dons do Espírito, procurai adquiri-los em abundância, mas para edificação da assembleia. 13Por isso, o que fala em línguas reze para obter o dom da interpretação. 14Porque, se eu rezo em línguas, o meu espírito está em oração, mas a minha inteligência não colhe frutos. 15Que fazer, então? Rezarei com o espírito, mas rezarei também com a inteligência; cantarei com o espírito, mas cantarei igualmente com a inteligência. 16De outro modo, se tu elevas um cântico de louvor só com o espírito, como pode o que participa como simples ouvinte responder «Ámen» à tua acção de graças, visto que não sabe o que dizes? 17A tua acção de graças será certamente muito bela, mas o outro não tira qualquer proveito. 18Graças a Deus, eu falo mais em línguas que todos vós. 19Mas, numa assembleia, prefiro dizer cinco palavras com a minha inteligência, para instruir também os outros, do que dez mil, em línguas. 20Irmãos, não sejais crianças, quanto à maneira de julgar; sede, sim, crianças na malícia; mas, quanto à maneira de julgar, sede homens adultos. 21Está escrito na Lei: Falarei a este povo por homens de outra língua e por lábios estranhos, e nem assim me hão-de escutar, diz o Senhor. 22Por conseguinte, o dom das línguas é um sinal, não para os crentes, mas para os incrédulos; já a profecia não é para os descrentes, mas para os crentes. 23Se toda a assembleia estivesse reunida e todos começassem a falar em línguas, os simples ouvintes ou descrentes que entrassem, não diriam que estáveis loucos? 24Mas se todos começarem a profetizar e entrar ali um descrente qualquer ou simples ouvinte, há-de sentir-se tocado por todos, julgado por todos; 25os segredos do seu coração serão desvendados e, prostrando-se com o rosto por terra, adorará a Deus, proclamando que Deus está realmente no meio de vós.

Aqui o grande sentido é o ouvir e o aprender a escutar. Paulo propõe uma comunidade radicalmente igual na diversidade dos dons e dos ministérios: a Igreja tem uma natureza coral. Não vemos assim nada que se assemelhe a um esquema piramidal.

Os capítulos 12 e 14 falam sobre a Igreja e sobre as comunidades, em contexto litúrgico. É a Igreja reunida em liturgia que nos dá a conhecer o mistério da própria Igreja.

Entre ambos os capítulos está o “hino à caridade” (cap. 13), que no discurso é uma digressão, ou seja, uma espécie de intervalo e parêntesis, uma espécie de corredor que Paulo abre no discurso, e que cria uma cintilação. De facto, em tudo é racionalidade no discurso, tem que haver emoção, experiência.

1 Cor 13

13 Cântico do amor - 1Ainda que eu fale as línguas dos homens e dos anjos,

se não tiver amor, sou como um bronze que soa

ou um címbalo que retine.

2Ainda que eu tenha o dom da profecia

e conheça todos os mistérios e toda a ciência,

ainda que eu tenha tão grande fé que transporte montanhas,

se não tiver amor, nada sou.

3Ainda que eu distribua todos os meus bens

e entregue o meu corpo para ser queimado,

se não tiver amor, de nada me aproveita.

4O amor é paciente,

o amor é prestável,

não é invejoso,

não é arrogante nem orgulhoso,

5nada faz de inconveniente,

não procura o seu próprio interesse,

não se irrita nem guarda ressentimento.

6Não se alegra com a injustiça,

mas rejubila com a verdade.

7Tudo desculpa, tudo crê,

tudo espera, tudo suporta.

8O amor jamais passará.

As profecias terão o seu fim,

o dom das línguas terminará

e a ciência vai ser inútil.

9Pois o nosso conhecimento é imperfeito

e também imperfeita é a nossa profecia.

10Mas, quando vier o que é perfeito,

o que é imperfeito desaparecerá.

11Quando eu era criança,

falava como criança,

pensava como criança,

raciocinava como criança.

Mas, quando me tornei homem,

deixei o que era próprio de criança.

12Agora, vemos como num espelho,

de maneira confusa;

depois, veremos face a face.

Agora, conheço de modo imperfeito;

depois, conhecerei como sou conhecido.

13Agora permanecem estas três coisas:

a fé, a esperança e o amor;

mas a maior de todas é o amor.

Este amor que Paulo fala é de difícil tradução e interpretação. Será um simples eros, na sua dimensão relacional? Será gratuidade, oblação, doação, carinho? O verbo agapaw já é usado por Homero no sentido de amor de amizade, uma empatia ou apreço. Seria um sinónimo de filéw.

O substantivo «agapê» só aparece no Novo Testamento, mas ele é a forma como a LXX traduz ahab, que é amor, “entranhas de misericórdia”. É, pois, enquanto leitor da LXX, que Paulo vai usar este termo nas suas cartas.

Outras palavras são usadas para traduzir o “amor”, sendo a mais comum fileo, que é um amor que implica uma reciprocidade, não assimétrica, um amor entre iguais. Liga-se a uma circulação de afecto, a uma correspondência e a uma cordialidade que não tem sentido único. Os autores utilizam ainda o termo eros, que também significa amor, mas um amor que implica duas coisas: a ideia de um desejo com implicações sensuais, sexuais (desejo e fusão).

O outro termo para designar amor é agapáw, que é um paradigma da alteridade. O amor agápico é uma relação baseada na assimetria, na reciprocidade. Trata-se de um amor gratuito, uma dicção unívoca e unilateral de amor.

Neste capítulo Paulo eleva o amor acima de tudo, sobretudo acima do culto judaico e pagão. Paulo diz aqui o que é um cristão, que não o é sem esta qualidade de amor.

O “amar por amar” é o grande intérprete de Deus, é o acelerador da história, é o que faz passar do hoje para o futuro de Deus.

Esta passagem de Paulo ganhou um estatuto de universalidade.

3.6. Escatologia

A escatologia está ao longo de toda a carta. E essa escatologia tem no centro Cristo e o anúncio da cruz, definindo a Igreja como “corpo”, que vive da sabedoria da Cruz de Cristo.

Paulo chama à comunidade de Corinto a “Igreja de Deus”, verdadeiramente o Templo de Deus, porque os seus membros receberam o Espírito Santo. Esta eclesiologia acentuadamente cristológica refunda a comunidade no seguimento de Cristo, e ao fazer isto Paulo faz imergir a sua estrutura escatológica: o Reino de Deus está presente, mas não em plenitude. Tem de haver uma abertura ao futuro de Deus, que nos faz viver na dependência de Deus, no limiar de uma plenitude que nos está prometida.

A ressurreição de Cristo é pois a pedra angular do pensamento Paulino. Claro que era uma categoria difícil de abordar no contexto judaico e helénico.

Os saduceus não acreditavam na ressurreição. No mundo helenístico, há crença na imortalidade (Fédon, Platão), mas é imortalidade de uma parte de nós, não no sentido do cristianismo. Por isso no Areópago, em Atenas, quando Paulo fala da ressurreição causa um choque. Também isso acontece na comunidade de Corinto.

Em 1 Cor 15, o primeiro anúncio é então de que Cristo ressuscitou, e essa ressurreição foi atestada pelos testemunhos.

1Cor 15, 3-8

3Transmiti-vos, em primeiro lugar, o que eu próprio recebi: Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras; 4foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras; 5apareceu a Cefas e depois aos Doze. 6Em seguida, apareceu a mais de quinhentos irmãos, de uma só vez, a maior parte dos quais ainda vive, enquanto alguns já morreram. 7Depois apareceu a Tiago e, a seguir, a todos os Apóstolos. 8Em último lugar, apareceu-me também a mim, como a um aborto.

Paulo utiliza o verbo no modo perfeito, que tem um sentido de algo acontecido no passado mas com repercussão no presente e futuro, mostrando que a Ressurreição não aconteceu apenas no passado, mas é algo presente: Cristo está ressuscitado. Há assim uma ligação entre ressurreição de Cristo e a vida da comunidade.

Não podemos viver como se o presente fosse a condição definitiva do homem. Como se tudo começasse e acabasse aqui. O cristão acredita que tudo será cumprido de uma forma plena. E se assim não for, diz Paulo, é vã a nossa fé.

1Cor 15, 12

12Ora, se se prega que Cristo ressuscitou dos mortos, como é que alguns de entre vós dizem que não há ressurreição dos mortos? 13Se não há ressurreição dos mortos, também Cristo não ressuscitou. 14Mas se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação, e vã é também a vossa fé. 15E resulta até que acabamos por ser falsas testemunhas de Deus, porque daríamos testemunho contra Deus, afirmando que Ele ressuscitou a Cristo, quando não o teria ressuscitado, se é que, na verdade, os mortos não ressuscitam. 16Pois, se os mortos não ressuscitam, também Cristo não ressuscitou. 17E, se Cristo não ressuscitou, é vã a vossa fé e permaneceis ainda nos vossos pecados. 18Por conseguinte, aqueles que morreram em Cristo, perderam-se. 19E se nós temos esperança em Cristo apenas para esta vida, somos os mais miseráveis de todos os homens. 20Mas não! Cristo ressuscitou dos mortos, como primícias dos que morreram. 21Porque, assim como por um homem veio a morte, também por um homem vem a ressurreição dos mortos. 22E, como todos morrem em Adão, assim em Cristo todos voltarão a receber a vida. 23Mas cada um na sua própria ordem: primeiro, Cristo; depois, aqueles que pertencem a Cristo, por ocasião da sua vinda. 24Depois, será o fim: quando Ele entregar o reino a Deus e Pai, depois de ter destruído todo o principado, toda a dominação e poder. 25Pois é necessário que Ele reine até que tenha colocado todos os inimigos debaixo dos seus pés. 26O último inimigo a ser destruído será a morte, 27pois Deus tudo submeteu debaixo dos pés dele. Mas quando diz: «Tudo foi submetido», é claro que se exclui aquele que lhe submeteu tudo. 28E quando todas as coisas lhe tiverem sido submetidas, então o próprio Filho se submeterá àquele que tudo lhe submeteu, a fim de que Deus seja tudo em todos.29Se assim não fosse, que procurariam os que se fazem baptizar pelos mortos? Se, de facto, os mortos não ressuscitam, porque motivo se fazem baptizar por eles? 30E nós também, porque nos expomos aos perigos a todo o momento? 31Todos os dias, arrisco-me à morte, tão certo, irmãos, quanto sois vós a minha glória em Jesus Cristo nosso Senhor. 32Se fosse apenas por motivos humanos, de que me adiantaria ter combatido contra as feras em Éfeso? Se os mortos não ressuscitam, comamos e bebamos porque amanhã morreremos.[ Sab 2, 6; Is 22, 13] 33Não vos iludais: «As más companhias corrompem os bons costumes.»[Paulo tem conhecimento da cultura clássica, esta citação é do livro Taídes, de Menandro] 34Sede sóbrios, como convém, e não continueis a pecar! Pois alguns de vós mostram que não conhecem a Deus: para vossa vergonha o digo.

Para Paulo, o que nos perdoou não foi a morte de Cristo, mas a sua morte e ressurreição. Cristo não nos resgata apenas porque deu a Sua vida por nós, como mártir, ou por ser o justo que Se oferece pelos pecadores. Os nossos pecados são perdoados pela sua morte e ressurreição, porque abriu para a humanidade uma nova fronteira. A verdadeira transformação é a morte-dom, dádiva e oferta que se abre à vitória da morte, que é a Ressurreição.

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